quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

A menina que roubava livros

A menina que roubava livros é uma história, no mínimo, peculiar.

Primeiro porque é uma história narrada pela morte, o que já causa um impacto inicial com a ideia de que, com um narrador desses, as coisas não podiam terminar muito bem.

Segundo porque o cenário é a Alemanha nazista durante a Segunda Guerra Mundial, de modo que as coisas de jeito nenhum poderiam terminar muito bem.

Terceiro porque não estou dando mais spoiler do que aquilo que você recebe logo nas primeiras páginas do livro: uma história narrada pela morte, tendo a guerra como pano de fundo e a Alemanha nazista como cenário, as coisas não serão propriamente cor de rosa. E a narradora nos diz isso o tempo todo, inclusive antecipando fatos como se nos preparasse para o que virá nas próximas páginas, e faz isso às vezes com uma crueza de detalhes chocante, às vezes com uma enorme delicadeza que faz o leitor se perguntar se leu direito... será que esse cara morreu mesmo?

Mas o final é o de menos nessa história.

Liesel é uma menina de nove anos que é entregue pela mãe a uma família adotiva. Seu pai era um comunista (então a gente já sabe o que possivelmente aconteceu com ele, apesar disso não ser dito literalmente), sua mãe estava doente, e seu irmãozinho morreu durante a viagem de trem até a casa da nova família. Liesel e a mãe interrompem a viagem para enterrar o corpo do menino e do bolso do coveiro cai um livro. Mesmo sem saber ler, a menina discretamente o furta. Assim começa sua carreira de roubadora de livros.


Na casa de seus novos pais, Rosa e Hans Hubermann, Liesel tem que deixar tudo para trás e se adaptar a uma nova vida. Ela sofre na escola em razão das dificuldades de aprendizado. Em compensação, na vizinhança mora Rudy, um menino de cabelos cor de limão que se tornaria seu melhor amigo.

Os pesadelos diários de Liesel com seu irmão morto a aproximam de Hans, já que ele passa as madrugadas com ela ensinando-lhe a ler. Liesel vai se apaixonando pelas palavras e se encantando com as histórias, e roubar livros passa a fazer parte de sua rotina, especialmente quando a polícia faz enormes fogueiras para queimar os pertences dos judeus e quando a esposa do prefeito oferece a Liesel sua grande biblioteca.

Numa noite, um homem bate à porta da casa da família Hubermann: é Max, filho de um amigo de Hans que morreu na Primeira Guerra. Eles sabem do perigo de abrigar um judeu, mas não hesitam em escondê-lo em seu porão. No frio do porão, com o medo de Max ser descoberto, e em meio aos livros, Max e Liesel iniciam uma grande amizade. 

Enquanto a cidade é bombardeada e a vizinhança se esconde em abrigos, Hans toca acordeão e Liesel lê histórias para acalmar as pessoas. É quando ela vai se dando conta do fascínio e da dualidade das palavras: com elas, Liesel conforta pessoas apavoradas pelo medo de morrer, e também é por meio delas que Hitler iludiu todo um país e causou a maior tragédia da história.

Mais tarde, seriam justamente as palavras que salvariam a vida de Liesel.


Estamos acostumados com livros e filmes que retratam a guerra, mas poucas vezes nos deparamos com histórias que relatam a vida das pessoas que não estão envolvidas diretamente com a guerra. Em A menina que roubava livros, as pessoas estão tentando levar suas vidas tão normalmente quanto possível, mesmo em meio ao medo, à fome, às privações, ao desemprego, aos bombardeios, às discussões políticas, à perda de pessoas próximas, e mesmo à proximidade da morte em tempo integral. E é nesse contexto também que Liesel e Rudy vivem o final de sua infância... e o final da vida de várias das pessoas que os rodeiam.

É um desses livros pra ler com o coração pequenininho, e quando vai chegando o final chega a dar dó de terminar de ler. Não porque é triste, mas porque é bonito demais pra acabar.
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